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A Princesa Amada dos Piratas
Tradutora: Manteiga
Revisor: Daniel
—50—
Na base naval, sempre havia alguns recrutas que escapavam à noite.
“Se forem pegos, enfrentarão punições severas, mas mesmo assim arriscam.”
Eles destoavam do cansaço das tarefas e iam para uma taverna próxima. Não era o certo a se fazer, mas quando eu estava de patrulha, às vezes fazia vista grossa.
Eu sabia o quanto o treinamento e o trabalho podiam ser exaustivos, então achava que um pouco de diversão de vez em quando não faria mal.
“Claro, também já fui pega acobertando eles e acabei sendo punida por isso.”
Por que eu estava me prendendo a pensamentos tão deprimentes de novo? Balancei a cabeça, tentando limpar a mente.
“Lala.”
Uma voz sussurrada veio bem ao meu lado. Era o Nereus.
“Ah! Você me assustou!”
O rosto dele estava tão perto que seus traços grandes e marcantes pairavam sobre mim, lançando uma sombra que o tornava ainda mais intimidador. Fiquei tão surpresa que quase soltei um grito, mas rapidamente cobri a boca com a mão.
“É assim que uma filha reage ao ver o rosto do pai?”
“Bom, às vezes as pessoas se assustam… acontece!”
Sentindo-me um pouco culpada, evitei fazer contato visual. Nereus, fingindo estar magoado, soltou um pequeno gemido antes de olhar para minha roupa.
“O que é essa bolsa aí?”
“I-Isto? Ah, isso é… pra carregar tesouros!”
Apertei a bolsa contra o meu lado. Eu tinha arrumado ela por precaução antes de sair do navio.
Vai que, né.
Se eu acabasse sozinha de repente, ou me separasse do Caelum, precisaria começar do zero por conta própria.
Desta vez, eu não queria me tornar oficial da marinha de novo. Apesar de já ter feito algumas conexões aqui e ali, sem dinheiro eu não conseguiria fazer nada.
“Steve está ligado a mim por causa de dinheiro, afinal.
O único motivo pelo qual ele continua por perto é porque prometi dinheiro e a cura pra doença da Maddie. Se eu não puder oferecer mais nada, ele com certeza vai embora também.
A vida é imprevisível, então nunca é uma má ideia estar preparada…
“Pai, o que você tá fazendo?”
Antes que eu percebesse, Nereus já tinha me levantado nos braços.
“Você tá planejando sair, né?”
“Sim.”
“Mas como exatamente pretende sair?”
“Pelas escadas?”
Tínhamos alugado uma estalagem inteira no território de Tenus. Como não estávamos exatamente nos escondendo, podíamos sair quando quiséssemos.
“O que você acha que está acontecendo lá embaixo agora?”
“Uh…”
Considerando a nossa jornada, provavelmente estavam apenas descansando do cansaço hoje e amanhã.
“Estão bebendo, por acaso?”
“Bingo.”
Eles estavam praticamente viciados em álcool a essa altura. Com a quantidade que bebiam, não seria surpresa se as veias deles corressem com licor em vez de sangue.
“E você quer passar bem no meio dessa galera? Isso é basicamente um convite pra ser pega.”
Desde o início, tínhamos decidido dar uma pausa nas operações enquanto estivéssemos em Caelum. O único motivo pelo qual eu estava apressando o Nereus era simples.
“Até lá, eu não vou conseguir sair livremente.
Assim que todos estivessem descansados e estabilizados, alguém com certeza iria sugerir: ‘Devíamos designar um protetor pra pequena Lala.’
Ainda mais depois de eu ter me metido em uns incidentes bem estranhos ultimamente.
“Merda. Eu realmente não esperava me machucar tanto na Ilha Odlo.
Quando o Ethan me viu ferida pela primeira vez, os olhos dele quase saltaram das órbitas. Em todo o tempo que eu o conhecia, nunca tinha visto ele fazer aquela cara.”
E assim, mesmo que o Caelum ocasionalmente tomasse decisões impulsivas, no momento, eles estavam em modo superprotetor total. Se eu quisesse agir livremente, teria que lidar com eles um por um, separando-os sistematicamente.
“Pai, você tem razão.”
“Mas é claro~”
Nereus sorriu de canto e me mandou segurar firme antes de, de repente, saltar pela janela.
‘Espera, esse é o terceiro andar?!’
Não que meus protestos fossem fazer alguma diferença. Ele aterrissou perfeitamente, me segurando com firmeza nos braços como se fosse a coisa mais fácil do mundo.
“Certo, vamos nessa–”
“Parados aí.”
Um arrepio percorreu minha espinha.
Uma voz solene soou atrás de nós, fazendo tanto eu quanto Nereus congelarmos no lugar.
Creeeek– Nereus virou a cabeça, duro como uma tábua, e viu Isaac parado ali, silhuetado contra a luz.
“Oh, Isaac? E aí~ saiu pra dar uma voltinha também? Eu só ia levar a Lala pra uma–”
“Onde exatamente você pensa que vai? Você realmente acha que uma desculpa tipo ‘só dando uma volta’ vai colar comigo?”
“…..”
Passo. Passo. Isaac caminhava em nossa direção, um passo deliberado de cada vez.
“Não existe a menor chance do capitão perder uma sessão de bebida. Eu lembro claramente de você virando um engradado inteiro no dia em que a Lala acordou da febre. E além disso, você nem penteou o cabelo dela antes de dormir como sempre faz.”
“…..”
“O que significa que com certeza tem algo acontecendo essa noite.”
“Merda, esse cara é esperto…”
‘Concordo.
Desde quando o Isaac era tão perceptivo? Ele parecia quase heróico enquanto encarava o Nereus.
“Neste caso, eu vou com vocês!”
“Você realmente acha que eu deixaria?”
“O imediato já tem uma noção do que está acontecendo, mas permitiu essa pequena escapada sob a condição de que eu acompanhasse vocês. Se você recusar, volto direto e conto tudo pra ele–”
“Pensando bem, ter mais uma pessoa pode não ser uma má ideia.”
‘Uau, que mudança repentina de atitude.
Mais do que isso, parecia que o Isaac demonstrava mais respeito pelo Gilbert, o imediato, do que pelo próprio Nereus. Não que Nereus parecesse se importar.
“Pra ser honesto, tô surpreso do Gilbert não ter vindo junto.”
“Se o capitão e o imediato saírem ao mesmo tempo, vai saber que tipo de confusão aquele pessoal vai arrumar?”
“Verdade. Se nós dois sumirmos, o Ethan vai ter trabalho. Diferente de mim, ele não tem presença intimidadora suficiente pra manter eles na linha.”
“…..”
“…..”
“Por que vocês tão me olhando desse jeito?”
O Nereus nunca teve exatamente uma aura intimidadora no Caelum—tirando o rosto meio bruto, claro.
Enquanto nos afastávamos da estalagem e chegávamos às ruas mal iluminadas, Isaac finalmente perguntou:
“Então, pra onde exatamente estamos indo?”
“Hã? A Floresta Negra.”
“A Floresta Negra.”
“Você ficou maluco ou—quer dizer, tá falando sério?”
Isaac mal conseguiu se corrigir depois de olhar pra mim. Honestamente, a frase original e a editada não tinham tanta diferença assim.
“Olha, só me escuta. Esse é o momento perfeito pra eles agirem, não acha? Se não for pra um acordo, pelo menos pra um relatório.”
Nereus tinha um ponto. Se um contrabandista estivesse organizando um encontro secreto, o intervalo mais lógico seria entre agora e o amanhecer.
Alguns dias atrás, se espalhou a notícia de que a marinha havia chegado à Ilha Odlo.
E não era só a Unidade 103 de sempre. O próprio Hyperion tinha ido pessoalmente avaliar a situação e dar ordens.
‘O que um garoto de oito anos pode fazer?’, eu pensei. Mas, por outro lado, ele era um Pharus, membro da família que representa a marinha.
‘E ele também é o futuro almirante.’
Se um símbolo do futuro da marinha pisou pessoalmente ali, então os envolvidos na distribuição de “Anjo” devem estar se sentindo pressionados.
Isso significava que, se o chefe da família Terminus estivesse realmente envolvido com o “Anjo”, logo ele morderia a isca. Mas, se nada acontecesse, isso indicaria que um terceiro estava apenas usando o nome Terminus.
‘Mais importante ainda, por que o Hyperion veio pessoalmente?’
Tudo o que eu tinha pedido era que uma mensagem simples fosse entregue. Inclinei a cabeça em reflexão e depois puxei o Nereus para que me colocasse no chão.
“Você sabe que eu posso continuar te carregando, né? Minha pequena Lala não pesa nada.”
“Cala a boca. E se eu esquecer como se anda? Foi você quem se preocupou com isso da última vez.”
“Mas você ainda é a minha garotinha.”
“E sua filha não gosta disso. Se você me ama, deveria me respeitar.”
Isaac, que estava ouvindo nossa conversa, murmurou baixinho: “A Lala é mesmo mais madura.”
Eventualmente, Isaac cedeu à lógica do Nereus. Afinal, a Floresta Negra, apesar da reputação sinistra, era na verdade um lugar relativamente seguro justamente por causa dos boatos assustadores ao seu redor.
Até mesmo criminosos evitavam o local.
“Então, por que exatamente estamos indo lá?”
“Tem um coração que o Solitário deixou cair.”
“O Solitário… coração…? Você tá falando daquele conto de fadas?”
“Sim. E eu quero ele.”
A expressão do Isaac demonstrou ceticismo por um momento—’Mas isso é só um conto de fadas…’—mas quando eu encarei ele, ele hesitou e guardou os pensamentos pra si.
‘Provavelmente tentando preservar minha inocência infantil.’
Esse é o tipo de bobagem que adultos acreditam quando leem livros de criação de filhos—algo sobre preservar os sonhos e esperanças da criança.
“Sim, eu quero,” falei com firmeza, como se encerrasse a discussão.
As pupilas do Isaac vacilaram, mas ele não teve escolha senão concordar com a cabeça.
“Bem… espero que você encontre.”
“Uhum.”
Claro que o coração era real, e eu até sabia mais ou menos onde ele estava escondido. Mas ainda era perigoso demais pra irmos atrás dele, então fingiria que não sabia.
“Por aqui.”
A essa altura, já tínhamos chegado às bordas da Floresta Negra. A atmosfera era sombria, com apenas alguns prédios abandonados e decadentes espalhados ao redor.
“Realmente não tem sinal de vida por aqui.”
“Nem o som de animais se mexendo.”
“Isso porque além da propriedade dos Terminus, na borda da floresta, fica a Terra Morta.”
Era o lugar perfeito para contrabando. Nereus e Isaac trocaram olhares.
‘Provavelmente estão pensando em dividir os lucros quando pegarem os culpados em flagrante.’
“Eu levo a Lala, já que sou melhor em combate do que você.”
“Tudo bem. Eu vou verificar o lado esquerdo da floresta.”
“Então eu fico com o direito.”
Sem hesitar, eles concordaram com o plano e se separaram. Eu segui o Nereus para a direita.
“Será que teria sido melhor ir com o Isaac?”
“Não, eu gosto mais do papai.”
Afinal, o Isaac parecia mais rígido que o Nereus. Mas fosse lá o que ele interpretou das minhas palavras, a expressão do Nereus se iluminou na hora, como se tivesse acabado de receber uma ótima notícia.
‘Idiota.’
Mais importante agora, eu precisava começar a procurar o Desmer. Justo quando estava pensando em como fazer isso, uma pedra grande apareceu na minha frente.
“Papai, papai, minhas pernas doem.”
“Eu sabia que isso ia acontecer. Vou te carregar.”
“Uuugh, não, vou só sentar aqui e esperar você.”
Nereus não parecia muito satisfeito. Parecia estar se lembrando do que aconteceu na Ilha Odlo.
‘Faz sentido. Ele só permitiu essa viagem porque eu ficaria grudada nele.’
Assumindo minha expressão mais inocente, falei de novo:
“Essa área é bem espaçosa. Vou só descansar dez minutinhos, tá? Você pode dar uma olhada e aí a gente vai embora logo em seguida.”
Era improvável que eu conseguisse muito Desmer em apenas dez minutos, mas com sorte, talvez desse para garantir o mínimo por enquanto.
‘Se eu falhar, sempre posso contratar um mercenário por aqui pra encontrar rapidinho.’
Eu realmente não queria depender de mercenários, mas se fosse necessário, não teria outra escolha.
Depois de hesitar um pouco, Nereus assentiu com a cabeça.
“Certo, mas se você vir alguém suspeito, tem que gritar imediatamente, ok?”
“Mmhmm.”
Mesmo enquanto se afastava floresta adentro, Nereus continuava olhando para trás para ter certeza de que eu ainda estava sentada ali. Eu acenei com os braços repetidamente até começarem a doer, e só quando ele finalmente sumiu de vista é que me levantei num pulo.
‘Sem tempo a perder!’
Encontrar Desmer em apenas dez minutos? Naquela escuridão? Parecia quase impossível localizar os cogumelos específicos de que eu precisava. Mas como eu conhecia as características do habitat deles, tinha uma vantagem.
A pedra ao lado da qual eu havia escolhido me sentar era uma pedra de artemísia. Desmer não crescia apenas na Floresta Negra; ele era frequentemente encontrado em solos onde havia pedras de artemísia.
‘Mas só porque há pedra de artemísia em outro lugar, não significa que Desmer cresça lá.’
Eu não fazia ideia do porquê, mas isso não importava agora. Eu só precisava colher o máximo possível de Desmer daquela área.
“Vamos ver…”
Me agachei, distinguindo cuidadosamente entre Desmer e outros cogumelos. Certifiquei-me de arrancá-los completamente, preservando os caules, quando de repente senti alguém se aproximando.
‘O Nereus já voltou?’
“Papai, você voltou tão rápi—”
Enfiando os cogumelos às pressas na mochila, levantei a cabeça, apenas para perceber que a pessoa diante de mim não era Nereus.
Mas também não era um completo estranho.
“Uma criança colhendo ilegalmente, hein.”
“…..”
“Ou devo dizer, uma coletora não autorizada?”
Era Selene.
‘Tem algo estranho.’
Ela parecia completamente diferente de quando eu a havia encontrado mais cedo naquele dia. Quase como se fosse uma pessoa totalmente diferente.